sábado, 2 de junho de 2007

Romeu e Julieta à moda londrinense

Companhia Ballet de Londrina vai estrear coreografia 'Decalque' na programação do Festival Internacional de Londrina, na semana que vem.

A música de Sergei Prokofiev (1891-1953) para o balé ''Romeu e Julieta'' é o mais próximo que o compositor conseguiu ver o céu - a obra de William Shakespeare (1564-1616) -, caindo na tentação de retocar o dramaturgo inglês. Para o compositor, o céu não deveria matar de amor. ''Pessoas vivas podem bailar, mas os mortos não têm como dançar'', pensou Prokofiev ao idealizar um final menos trágico para a história dos amantes de Verona.

Ainda em tempo de concluir a partitura, o compositor mergulhou mais profundamente no oceano que se atravessa com água pelos tornozelos - Shakespeare - renunciando apunhalar pelas costas a obra imortal, se tornando autor de uma música destinada também a viver para sempre.

A alma de Prokofiev não é pequena e compreende Shakespeare, aparecendo juntos na coreografia ''Decalque'', de Leonardo Ramos, que a Companhia Ballet de Londrina estréia dia 9, às 20h30, dentro da programação do Festival Internacional de Londrina (FILO).

Com 1h10 de duração e um intervalo de 10 minutos, o espetáculo será apresentado nos dias 22, 23 e 24, no Teatro Dança, no Edifício Itália, em São Paulo. Ramos já cruzou o oceano shakespeariano outras vezes com o dueto ''...&...'', em 1996. A música de Prokofiev ia à frente. Outra travessia pelo dramaturgo foi com ''2 e Nada Mais'', coreografia de 1998 para a ''West Side Story'', de Bernstein.

Em 2008, o grupo londrinense completará 15 anos. Maturidade saborosa mobiliada com o vigor de um elenco formado por bailarinos com mais tempo de casa, entre os quais Alessandra Menegazzo, Alexandre Micale, Carina Corte, Cláudio de Souza, José Maria, Luciana Lupi, Marciano Boletti e Viviane Terrenta, e pelo frescor de estreantes, como Bruna Rosa e Juliana Rodrigues, que veio de Belo Horizonte (MG).

''A coreografia 'Decalque' faz parte desse processo. Nos últimos três anos, percebemos um amadurecimento de traços da linguagem da companhia com doses de maturidade que eram soltas, com base no balé clássico, que tem um registro corporal integral e sólido. Logo depois do espetáculo 'Fala Baixo', queríamos fazer a cena do balcão de 'Romeu e Julieta', mas a nova coreografia acabou sendo obra da própria música de Prokofiev.

A dramaturgia de Shakespeare não aparece, revelando-se apenas no corpo dos bailarinos. Não é uma história linear, mas o público perceberá as situações'', afirma Ramos, dando a Shakespeare o que é de Shakespeare e o que a Prokofiev o que é de Prokofiev.

Com assistência de direção de Ana Maria Aromatário e cenários de Maria Laura, emoldurando o drama em vitrais, o céu na tragédia, que entregou ao amor um punhal, não esconde a vivacidade nos primeiros passos coreográficos, que despertam a paixão delicada, que não se sobrepõe à força física de parte do elenco masculino.

Ramos despe a inocência de Romeu e Julieta na frente do público. Os que já assistiram outras coreografias do diretor da companhia londrinense não estranharão a pele nua da sensualidade de sua trajetória, que sempre se exibe na janela, convidando o espectador para entrar.

O coreógrafo mexe com a imaginação do público, que não vê no palco só um Romeu e uma Julieta, mas sente que na concepção do diretor o amor invencível no céu de Shakespeare não vive ou morre somente no coração de um homem e uma mulher. ''É a minha maneira de interpretar. Sempre tenho uma sensualidade, que é a minha força vital. Não há uma coreografia minha que não tenha um beijo. É uma coisa que gosto de fazer e pago um preço alto por isso. Esse espaço, o palco, é além dos limites que vemos, tendo algo mais para dizer. Também temos um grupo de bailarinos que convive comigo há muitos anos e que entende o que quero'', afirma Ramos, que para confundir ainda mais o olhar, as impressões e emoções do público está levando para o palco um elenco de cabeça raspada, aproveitando uma tragédia para falar de diferentes formas de amor, o céu ou inferno, que pode ser uma experiência de companheirismo, doação, ternura, paixão ou solidão.

A grandiosidade da obra de Shakespeare e da música de Prokofiev lança o elenco ao desafio do corpo ao se meter no meio dos dois amantes de Verona, buscando novos eixos de equilíbrio e apoios para a locomoção.

Começando com movimentos de chão até terminar nas alturas da alma e do esforço físico do elenco, ''Decalque'' é uma coreografia generosa em que cada bailarino tem a chance de mostrar quem mora dentro de seu Romeu ou sua Julieta, personagens imortais chamados na janela por Ramos para dar o depoimento do que Prokofiev viu de Shakespeare em sua música, criada originalmente para o Bolshoi.

SERVIÇO:

- Estréia do espetáculo ''Decalque''
Quando - Dia 9
Onde - Teatro Ouro Verde (Rua Maranhão, 85)

Francismar Lemes
Reportagem Local

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